28.9.10

Kurt Schwitters: An Anna Blume

"An Anna Blume" está entre os poemas mais polêmicos da literatura alemã. Até hoje se discute se Kurt Schwitters estava falando sério ou brincando... Diga aí, leitor/a: Kurt ama ou não ama Anna? ;-)


AN ANNA BLUME

Merzgedicht I
(um 1919)

O du, Geliebte meiner siebenundzwanzig Sinne, ich
liebe dir! — Du deiner dich dir, ich dir, du mir.
— Wir?
Das gehört (beiläufig) nicht hierher.
Wer bist du, ungezähltes Frauenzimmer? Du bist
— bist du? — Die Leute sagen, du wärest — lass
sie sagen, sie wissen nicht, wie der Kirchturm steht.
Du trägst den Hut auf deinen Füssen und wanderst
auf die Hände, auf den Händen wanderst du.
Hallo, deine roten Kleider, in weisse Falten zersägt.
Rot liebe ich Anna Blume, rot liebe ich dir! — Du
deiner dich dir, ich dir, du mir. — Wir?
Das gehört (beiläufig) in die kalte Glut.
Rote Blume, rote Anna Blume, wie sagen die Leute?
Preisfrage:   1.) Anna Blume hat ein Vogel.
                   2.) Anna Blume ist rot.
                   3.) Welche Farbe hat der Vogel?
Blau ist die Farbe deines gelben Haares.
Rot ist das Girren deines grünen Vogels.
Du schlichtes Mädchen im Alltagskleid, du liebes
grünes Tier, ich liebe dir! — Du deiner dich dir, ich
dir, du mir, — Wir?
Das gehört (beiläufig) in die Glutenkiste.
Anna Blume! Anna, a-n-n-a, ich träufle deinen Namen.
Dein Name tropft wie weiches Rindertalg.
Weiss du es, Anna, weisst du es schon?
Man kann dich auch von hinten lesen, und du, du
Herrlichste von allen, du bist von hinten wie von
vorne: »a-n-n-a«.
Rindertalg träufelt streicheln über meinen Rücken.
Anna Blume, du tropfes Tier, ich liebe dir!


Para Anna Flor*
Poema Merz I
(c. 1919)

Ó tu, amada dos meus vinte e sete sentidos, eu
lhe amo! — Tu teu te a ti, eu a ti, tu a mim.
— Nós?
Isto (aliás) não vem ao caso.
Quem és tu, dona inumerável? Tu és
— és? — Dizem que serias — deixa
que digam, eles nem sabem como a torre da igreja se sustém.
O chapéu sobre os pés, caminhas
sobre as mãos, com as mãos tu caminhas.
Olá, teus vestidos vermelhos, serrados em pregas brancas.
Eu amo Anna Flor vermelho, vermelho eu lhe amo! — Tu
teu te a ti, eu a ti, tu a mim. — Nós?
Isto (aliás) é coisa para a brasa fria.
Flor vermelha, vermelha Anna Flor, o que andam dizendo?
Responda e ganhe:  1. Anna Flor tem um macaco no sótão.
                               2. Anna Flor é vermelha.
                               3. Qual é a cor do macaco?
Azul é a cor do teu cabelo amarelo.
Vermelho é o chiado do teu macaco verde.
Tu, moça simples de vestido de chita, tu, doce
bicho verde, eu lhe amo! — Tu teu te a ti, eu
a ti, tu a mim, — Nós?
Isto (aliás) é coisa para o braseiro.
Anna Flor! Anna, a-n-n-a, gotejo o teu nome.
Teu nome pinga como tenra gordura bovina.
Sabes, Anna? Já o sabes?
Posso ler-te também de trás para frente, e tu,
a mais formosa de todas, serás sempre, de trás para frente e de
frente para trás: »a-n-n-a«.
Gordura bovina goteja acaricia minhas costas.
Anna Flor, tu, bicho gotejante, eu lhe amo!


Tradução Fabiana Macchi
Publicado em Sibila - Revista de Poesia e Cultura, Ano 4, n. 7, 2004



* A primeira versão da tradução deste poema foi feita sem que eu soubesse da existência da tradução de Haroldo de Campos, datada de 1956. A leitura posterior da tradução de H. de Campos levou-me a uma revisão da minha primeira versão. 

Não se sabe se por opção ou por equívoco, Haroldo de Campos traduziu literalmente a expressão idiomática "ein Vogel haben" - "ter um pássaro" -, que significa "não bater bem da bola", "ter um parafuso a menos".  Eu optei por uma expressão idiomática semelhante em português: "ter macacos/macaquinhos no sótão", que no Brasil significa exatamente "ter um parafuso a menos" e também tem uma estrutura sintática e semântica semelhante (verbo ter + animal) à da expressão usada no opriginal.
   

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